Ângela Vilma
Registro interno de solidão:
tenho 32 cadeiras.
Receberei um dia 32 visitas?
32 pessoas um dia aqui se sentarão?
Há de diversas formas: de balanço, de
varanda, de jantar. Cadeira artesanal, espreguiçadeira, banquinhos.
Há uma parecida com aquelas da sala de
jantar de lá de casa: aquelas que beliscavam nossas bundas.
Se faço coleção?
Se é uma estranha mania?
Registro interno de solidão:
Tenho quatro grandes mesas.
E dois bules de café.
Tenho muitos talheres.
Uma casa enorme para ouvi-los tilintar.
Mãe comia de colher, às escondidas de
pai.
E de colher me ensinou a comer.
Pai era civilizado: sabia andar em
Salvador,
sabia escrever bem, lia Dona Flor,
usava roupa de casimira e paletó.
Mãe não: suas roupas eram sempre
estampadas
costuradas por suas mãos
com cheiro de cebola.
Registro interno de solidão:
Tenho um guarda-roupa antigo.
Ele contém dez vestidos estampados.
Envelheço como mãe, e nela me misturo
aos seus traços entalhados,
às rugas mais fundas, mais velhas,
e juntas nos parecemos, engraçado,
à nossa antiga geladeira.
Publico acima uma poesia da minha amiga Ângela Vilma. Poema belíssimo que toca fundo a minha alma. Espero vê-lo em breve publicado em livro para que muitos também possam ler e se emocionar; para que muitos também tenham o privilégio que eu tive - numa tarde de inverno em sua linda casa, quando ela me mostrou os seus inéditos - de saborear a sua poesia.
Como não me emocionar com tamanho carinho? Só você, pessoa tão especial, para tamanho gesto de ternura. Amiga querida, obrigada!
ResponderExcluirVocê e sua poesia merecem todo o carinho. Bjs
ExcluirÂngela Vilma é escritora por inteiro, plena, tomada pela poesia e pela memória singular, que nos oferece continuamente em seu blog Aeronauta, faz um tempão, os melhores textos da web. Fico sempre à espera de um novo livro e creio que um romance fragmentário está praticamente pronto em seu blog, e que belo romance será. Você fez uma bela escolha com Mobília, amada. Bjsamovc (carlos barbosa)
ResponderExcluirPuxa, Carlos Barbosa, ouvir isso de você, grande romancista, me deixou muito alegre, feliz. Abraços.
ResponderExcluirEu também espero, ansiosa, o novo livro da nossa amiga. E concordo com Carlos, os textos no Aeronauta, repletos de poesia e de memória, estão prontos para serem publicados. Bjs
ResponderExcluirComo diz meu irmão Carlos Barbosa, nas nossos papos informais, e que Ângela Vilma me perdoe pela tosca frase:
ResponderExcluir...é de lascar!
Lascar vozes, dilacerar corações e derramar lágrimas.
Bravo!
Abigail Bastos
Belíssimo, denso, sensível.
ResponderExcluirA escrita vigorosa da Angela.
beijoss :)
Que interessante; uma contabilidade de objetos simbólicos.
ResponderExcluir