segunda-feira, 18 de novembro de 2013

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Sobre a vida



Embora tenha passado mais de um mês na UTI após um AVC, meu pai retornou pra casa e começou a se recuperar: voltou a andar e a falar quase que normalmente. Morreu num domingo, no meio de uma frase, enquanto contava uma de suas histórias pros amigos. Dizem que deu um suspiro mais longo e apagou. Simplesmente. 

Eu não estava lá. Naquele final de semana não pude viajar e nem deu tempo dele ler a minha última carta (enviava-lhe uma semanalmente).

Ontem, após cinco anos, minha filha me contou que, no nosso último encontro, enquanto eu me dirigia ao carro às lágrimas, ele a abraçou e disse-lhe que aquela seria a última vez que nos veria, pra ela cuida de mim.

Foi assim, e eu não tenho nenhum poema, somente esse silêncio tão fundo e a certeza de que a vida é muito bela.

terça-feira, 8 de outubro de 2013

O retrato




Nós morávamos no interior do interior de Sergipe, em um lugarejo tão remoto do agreste sergipano que, em meados dos anos de 1980, ainda não era alcançado sequer pela luz elétrica. Por isso quase não temos fotografias da infância. Mas houve um dia em que nossa mãe nos arrumou (eu e meu irmão mais velho) e nos levou para cidade (para rua, como ela ainda hoje fala) para tirarmos retratos. Eu tinha menos de um ano e esse olhar já muito alumbrado diante do mundo.

O retrato, eu trouxe lá da casa da minha mãe para restaurar. Ainda não fiz e o posto assim, marcado pela umidade, pela poeira, pelo tempo que passou e jamais voltará, e que também deixou marcas profundas e definitivas no meu corpo e na minha alma.

sábado, 7 de setembro de 2013

Um presente

PARA MÔNICA MENEZES

na minha casa não tem verbenas
tem sim uma varanda vaga
e um muro tão baixo
que poderias pular e vir correndo
ao meu encontro

na minha casa tem tantos santos
bem poderias aprender comigo
a rezar todos os terços
cantar os encantos do mar
ouvindo meus orixás

na minha casa também tem cristaleira
e delicadas xícaras, tão velhas, como as areias
se desmanchando em extrema solidão

mas tu não vens à minha casa
e tudo se parte, e tudo não existe...
as verbenas que não plantei, enfim, aparecem


Ângela Vilma

terça-feira, 30 de julho de 2013

Poema oração


Nossa porção de noite suportar,
Nossa porção de amanhecer também.
Nosso vazio, com êxtase ocupar.
Ou ao nosso vazio, o desdém.

Uma estrela aqui, outra ali.
Alguma se extravia.
Aqui névoa, névoa além,
Depois, dia!

DICKINSON, Emily. Um livro de horas. Trad. Ângela-Lago. São Paulo: Scipione, 2007.

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Brincadeiras de rua

                                             
                                         Parceria de Dominguinhos e Carlos Barbosa

terça-feira, 16 de julho de 2013

Os dias



não sei por onde anda a minha poesia
tenho arrumado gavetas
organizado estantes
e preparado a casa

nenhuma necessidade de dizer
nenhum grito preso na garganta
somente a beleza dos dias
que, silenciosamente, passam

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Adeus




Tive um aluno cujo sonho era dirigir carretas. E ele conseguiu. Há alguns anos, Bruno percorria feliz as estradas do Brasil, levando mercadorias de norte a sul. 

Ontem, na Curva do Cavaco, na BR 116, entre as cidades de Feira de Santana e Antônio Cardoso, a carroceria de uma carreta que vinha na pista contrária descontrolou-se e bateu de frente com a carreta de Bruno.

Hoje, a avó, a esposa, a filhinha de três meses (Bruna), os tios, os primos e a maior parte dos habitantes da Colônia Treze, povoado da cidade de Lagarto, em Sergipe, estão esperando o corpo do jovem trabalhador de 28 anos de idade – que era querido por todos por sua generosidade, alegria e compromisso – para dizer adeus.

Chove muito por lá e, apesar de já ser junho, faz silêncio.

sábado, 8 de junho de 2013

Muadiê Maria



“Nasci na maré de março.

E um dia, na praia da Pituba,

as ondas estavam bravíssimas e altas.

Feito um bicho, veio a maior de todas,

As pessoas saíram correndo da água.

Ficamos apenas eu e meu pai. Juro

que é verdade.

Só nós dois no mar, em frente aquela onda gigantesca”.


Recebemos ontem, pelos Correios, o belo livro de Martha Galrão, Muadiê Maria. Estou aqui deslumbrada com a simplicidade, o lirismo e a beleza das palavras dessa escritora que, nesse livro da Coleção Cartas Baianas da Editora P55, nos presenteia com preciosidades da sua memória, como no trecho – belíssimo – em que ela e o pai enfrentam uma onda gigantesca na praia da Pituba.

O pai, a filha e a onda: metáfora maior para o ensinamento da beleza. Ensinamento esse que Martha soube receber e multiplicar em poemas.

Obrigada, Martha.

Um beijo.