domingo, 2 de dezembro de 2012

A queda


“A neurologista do hospital de Pádua, depois de examinar Tito, encaminhou-o a uma neurofisiatra do hospital de Veneza.
Nas semanas seguintes, a neurofisiatra submeteu-o a uma série de testes.
Quando os testes terminaram, ouvi pela primeira vez – com medo e terror – o termo que, daquele instante em diante, passaria a dominar minha vida.
Tito tinha uma paralisia cerebral.
O medo durou uma semana.
Depois passou.
O motivo pelo qual o medo passou em apenas uma semana foi uma queda.
Tito estava em meu colo. Eu lia o jornal no sofá da sala. Minha mulher, andando apressadamente de um lado para o outro, prendeu o pé na ponta do tapete e levou um tombo, na nossa frente. Vendo o tombo, Tito gargalhou. Simulamos outros tombos. Ele gargalhou, gargalhou e gargalhou. Nós gargalhamos com ele.
A paralisia de Tito tornou-se imediatamente mais familiar. O slapstick era a linguagem que todos compreendíamos.
Tito cai. Minha mulher cai. Eu caio.
O que nos une – o que sempre nos unirá – é a queda.”


MAINARD, Diogo. A queda: as memórias de um pai em 424 passos. 3.ed. Rio de Janeiro: Record, 2012. p. 60


Eu não gosto do intelectual Diogo Mainardi, pelos mesmos motivos que levam muitas pessoas a não gostarem. No entanto, gostei muito de ler seu livro A queda. Fiquei tocada com o modo sincero, intenso e humano como ele narra a sua experiência de pai de um garoto com paralisia cerebral.

Eu não gosto do intelectual Diogo Mainardi. Mas eu gosto do pai de Tito.

quarta-feira, 28 de novembro de 2012

...



Drummond, Cabral e Ana C. Os poetas que abriram os portais deste caminho que percorro semanalmente. Pareceu mágica. Havia pequeninos fachos de luz entre meus dedos e o meu corpo estava leve. Nasceu uma flor. Pequenina e frágil como eu. Sim.

Hoje faz um ano.


segunda-feira, 26 de novembro de 2012



o que importa o cimento fresco no piso da varanda
ou o nome na lista de aprovados?
o que importa o gol,
a festa?

as pessoas morrem.

domingo, 18 de novembro de 2012

Simples


No dia 15 de novembro de 1972 nasceu meu irmão mais velho. 15 anos depois, no mesmo dia 15, do mesmo mês, praticamente no mesmo horário em que o primeiro, nasceu minha irmã mais nova. 

"Não houve nenhum planejamento. É somente a vida e os seus mistérios". Foi o que minha mãe me disse um dia, com sua natural simplicidade, enquanto varríamos o pátio da nossa casa que se perdeu.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Carta desesperada



Como é difícil, Beatriz, escrever uma carta...
Antes escrever os Lusíadas!
Com uma carta pode acontecer
Que qualquer mentira venha a ser verdade...
Olha! O melhor é te descrever, simplesmente,
A paisagem,
Descrever sem nenhuma imagem, nenhuma...
Cada coisa é ela própria a sua maravilhosa imagem!
Agora mesmo parou de chover.
Não passa ninguém. Apenas
Um gato
Atravessa a rua
Como nos tempos imemoriais
Do cinema silencioso...
Sabes, Beatriz? Eu vou morrer!
  

QUINTANA, Mário. Antologia poética. Porto Alegre: L&PM, 2001.